Hoje, 07 de maio, é considerado o Dia Nacional da Masturbação nos EUA.
Esse dia foi instituido por acaso. Em 1995 Jocelyn Elders, a primeira negra a assumir o cargo máximo do Departamento de Saúde dos EUA, fez um discurso na ONU para o Dia Internacional de Combate a AIDS e, diante de um questionamento sobre a prática da masturbação, falou que, em sua opinião, é um comportamento natural que faz parte de nossa sexualidade, e como tal, deveria ser estudada e ensinada.
Essa declaração resultou no término precoce de seu mandato. Ela foi demitida pelo então presidente Bill Clinton.
Revoltada com a demissão, uma empresa de vibradores lançou o tema em fóruns de discussão, o que causou uma forte reação e o dia 07 de maio foi, em homenagem a Jocelyn, definido como Dia Nacional da Masturbação.
Posteriormente o mês de maio foi oficializado como o Mês Internacional da Masturbação. Mês que tem desafios, competições (sim, existe competições de masturbação, seja no conforto de casa ou coletivas mesmo).
Porém ainda discutimos muito pouco sobre nossa relação com nosso próprio corpo e nosso prazer. Infelizmente, apesar de pessoas como Jocelyn e uma cultura que se diz cada vez mais aberta para assuntos relativos ao sexo, a masturbação ainda é motivo de vergonha, culpa e repressão.
O ato de se dar prazer é talvez a principal ferramenta de construção de nossa própria imagem. A prática contemporânea limita essa percepção aos genitais, causando vários problemas de auto-estima e de conexão com sentimentos e seu poder orgástico.
A história da masturbação
Existem registros do ato de se masturbar desde o início do Homo Sapiens, em pinturas rupestres e até a ascensão do cristianismo era considerada uma prática natural, utilizada inclusive em rituais, seja com auto-toque individual ou masturbação coletiva, por grandes civilizações como no Antigo Egito e os Maias.
Com a chegada da cultura judaico-cristã a história mudou e a repressão das manifestações sexuais começou. O desperdício de esperma era considerado um pecado grave, pior até que o incesto.
Tal comportamento foi baseado talvez em uma interpretação equivocada da história de Onã, na Bíblia, que ao “derramar seu sêmen na terra” enfureceu a Deus, que o puniu. Porém o que enfureceu Deus não foi o coito interrompido por Onã, mas a ele não ter fecundado a mulher de seu irmão morto para que sua descendência fosse garantida, que era o que Deus havia ordenado.
No séc. XVII a medicina descobriu a existência dos espermatozóides e, então a masturbação começou a ser perseguida também pela ciência já cada espermatozóide começou a ser considerado um feto e desperdiçá-lo seria como realizar um aborto.
A condenação da masturbação pelos médicos continuou pelo século XIX onde definiram a auto-satisfação como uma compulsão que poderia causar diarréia, vômitos, debilidades e impotência. Durante os séculos XVIII e XIX também foram disseminados mitos anticientíficos visando desencorajar os jovens no âmbito psíquico, levando a casos extremos de culpa, medos e recalcamentos que nos acompanham até hoje.
O ocidente somente começou a enxergar o ato de se tocar de maneira diferente no século XX com o advento das teorias da psicologia de Freud e seus contemporâneos. Apesar disso até hoje se masturbar é considerado imoral para as igrejas cristãs e a grande maioria das pessoas carrega culpa, vergonhas e bloqueios psíquicos quanto a se dar prazer e se descobrir.
A masturbação no Oriente.
Para as filosofias hindus e chinesas (falando mais especificamente do Tantra e do Taoísmo) a masturbação sempre foi vista com naturalidade e como uma prática saudável de estimulação da energia sexual e auto-conhecimento.
Porém tanto o Tantra quanto o Taoísmo condenam o excesso de ejaculação para o homem. Para essas filosofias, até os 20 anos de idade o homem pode ejacular quantas vezes quiser, mas depois deve aprender a controlar seu ímpeto e canalizar sua energia.
Para os adeptos dessas práticas o sêmen “é a possessão mais valiosa do homem”. É a manifestação física de sua energia vital, ou seja, cada vez que ejacula seu corpo enfraquece e “morre” um pouco.
O sêmen era usado em alguns rituais que incluem masturbação para alimentar talismãs ou “levá-lo para suas origens”, ou seja, espalhá-lo em campos, sob árvores, em águas sagradas ou no fogo sacrificial. Ou até esfregar preparados de sêmen sobre o corpo.
O homem perde energia através da ejaculação enquanto a mulher perde seu Chi através da menstruação e da gravidez. Portanto o homem deve aprender a se dar prazer sem ejacular, ou seja, a ter orgasmos secos e assim aprender a controlar seu corpo e se conhecer melhor.
Já a mulher pode se masturbar quanto quiser. Segundo o taoísmo a masturbação feminina libera sua energia erótica pelo corpo e a ajuda a ganhar mais controle sobre seus reflexos sexuais. É uma maneira de alimentar o auto-erotismo além de agradar as divindades que habitam dentro dela.
No oriente a masturbação é um ato natural porém a ejaculação deve ser controlada para que o homem não desperdice seu Chi.
Como você se masturba?
Hoje em dia, apesar de termos uma cultura mais “liberal” quanto ao sexo a masturbação ainda continua sendo um dos maiores tabus para grande parte das pessoas.
Você fala com seus amigos ou amigas sobre como você se toca? Onde você gosta mais de se tocar? Como? Em que posição? Em que momentos tem mais vontade? Se usa algum brinquedo?
E você fala sobre isso com seus/suas parceiros ou parceiras?
A masturbação ainda carrega tanta culpa e vergonha que para muitos casais chega a ser uma ofensa seu parceiro ou parceira se masturbar ao seu lado. Ou inclusive se ele ou ela se masturba, não importa onde e quando. Afinal, se pode fazer sexo porque se masturbar né?
E toda essa repressão, recalque, culpa, vergonha…sejam quais forem os sentimentos que mais nos acompanham fazem com que usemos nossos momentos a sós para gozar o mais rápido possível. É aprender o caminho mais rápido e fácil e replicar sempre que estiver precisando relaxar.
É assim…curto, grosso e objetivo. Estou tenso e 2 minutos depois Bum! Um orgasminho genital pra me dar uma descarga de hormônios e relaxar. Muitas vezes acompanhados de um pornô ou imaginando aquele crush em cima de você.
A masturbação é talvez a principal ferramenta de construção da nossa auto-percepção. Nosso corpo busca o prazer e é através do prazer que ele vai se reconhecer. Se limitamos a exploração do nosso corpo a um ponto específico ou somente a um tipo de sensação o que acontece?
Problemas graves de auto-confiança de auto-estima, muito comum em nossa sociedade. Dificuldade de dizer “não”, carência, ansiedade, depressão…são sintomas de alguém que não tem uma imagem completa de si mesmo, que não se acha equiparável aos outros. Sua imagem se limita ao seu clitóris ou ao seu pênis e seu prazer é constantemente projetado ao fatores externos, seja pelo pornô ou as pessoas que rodeiam suas fantasias.
Se masturbar deveria ser um ritual. Deveria ser como fazer amor com a pessoa que você mais ama (que seria você, não?).
Uma música, velas, incensos, meia luz. Toques suaves e lentos, olho no olho, o corpo sendo explorado. Novas sensações, novos sentimentos…cabeça voltada ao que você está sentindo. Quando está com alguém o momento ideal é esse não? Ou gostaria de gozar rápido, virar para o lado e dormir? Acho que não.
Brincar e fazer amor consigo mesmo deveria ser natural e rotineiro. Imagem: @agathesorlet
E como posso fazer amor comigo mesmx?
Existe uma prática que passo para quase todos meus interagentes para praticarem em casa e assim ressignificar a masturbação e a relação para com seus corpos. Pode ser chamado de “Mindfull Masturbation” ou “Auto-toque erótico”. Os resultados são rápidos e incríveis.
Como se auto-massagear?
A auto-massagem erótica tem como objetivo ressignificar como lidamos com nosso corpo e como nos relacionamos com nosso prazer. Nos possibilita nos conhecer mais e melhor e assim nos aceitarmos e nos amarmos mais. Nos primeiros dias pode ser frustrante ou agonizante testar outros caminhos para outros tipos de prazer, pois nosso cérebro está acostumado com o mesmo padrão de toque e o mesmo padrão de orgasmo que repetimos desde a adolescência.
Mas com o tempo a conexão com o corpo fica mais forte, a pele mais sensível e a habilidade de focar nos sentidos mais intensa. Sua auto-estima irá aumentar e o sexo melhorar significativamente.
Vamos lá:
– Defina uma quantidade de tempo, coloque o despertador para não se perder nas carícias. O ideal é ter de 20 a 45 minutos para a prática, Você também pode começar com 5 minutos e ir aumentando gradativamente, É normal não conseguir manter a atenção por muito tempo no começo. Encare isso como uma academia, quanto mais você treinar melhor vai ficar.
– Encontre um lugar que se sinta seguro(a) e confortável, que você se sinta bem para que relaxe e aproveite o momento. Pode ser sua cama, o sofá ou até o chão, se essa possibilidade te excita.
– Deixe de fora brinquedinhos que já está acostumado(a) a usar, pornografia ou fantasias eróticas. Foque em seus sentimentos, emoções e sensações. Foque em seu prazer e em seu corpo. Admire ele, suas curvas e imperfeições. Admire suas mãos percorrendo por ela e ao mesmo tempo que as sensações que cada tipo de toque te trás.
– Comece acariciando seu corpo, evite os genitais em um primeiro momento pois esse caminho você já conhece muito bem. Pode começar tocando seu rosto. Massageie seu peito, aperte seus braços, puxe seu cabelo…explore o corpo inteiro, não somente em vias sexuais, mas as diferentes sensações de cada parte.
– Permita-se testar novas posições e novos toques. Se mexa, mude de posição. Fique de 4, sentado(a), de pé…dance. Toque sutilmente, aperte, arranhe. Gema, suspire, grite…fale sacanagem para si. Mescle respirações curtas e ofegantes com profundas e vagarosas. Enfim, descubra o que funciona melhor para o seu corpo. Se nunca se penetrou tente. Se nunca usou óleo ou creme no corpo use. Se permita em sua oralidade, experimente todos os tipos de sons, movimentos e fluídos.
– Se você é homem não se preocupe com ereção. Com o tempo você vai perceber que o prazer, inclusive os orgasmos, não precisam de um pênis ereto, nem tampouco de uma ejaculação.
– Crie uma intenção cada vez que for praticar. Pode ser “quero estar totalmente presente as sensações do meu corpo” ou “não tenho objetivos com esse auto-toque, somente sentir”.
– Sempre varie as práticas, não crie um outro atalho para seu prazer, nossa mente tende a fazer isso. Faça um dia deitado, no outro de pé, no outro dançando. Toque um dia em algumas partes do seu corpo, no outro dia em outras partes…num dia pode respirar de maneira mais ofegante e no outro de maneira mais profunda. Seja criativo(a).
– Quando encontrar um ponto de prazer fique nele, explore-o de diferentes maneiras, sinta esse prazer ao máximo. Esvazie sua mente e se atenha as sensações. E se algo não parecer bom simplesmente vá em frente. Mude de lugar ou varie o movimento ou a pressão.
– Você pode focar em somente um ponto do corpo durante toda a sessão, ou percorrer todo ele. Até eventualmente chegar aos genitais. Não há ordem certa, simplesmente esteja com você e se explore.
– Podem existir partes do seu corpo que você nunca tocou e que podem te dar sensações que você nunca sentiu. Ou um tipo de som específico, pressão específica ou respiração específica que pode te trazer esse tipo de sensação. O orgasmo não é o objetivo. Ele pode ou não acontecer. O objetivo aqui é sentir seu corpo e todas as sensações prazerosas que ele pode te oferecer. Assim como aprender sobre o que gosta ou não gosta. Então, quando estiver com alguém, pode conduzir com segurança para o que te excita, o que te faz sentir bem ou para o que é realmente gostoso para você. Assim como evitar situações que não te dão prazer, te deixam desconfortável ou te broxam. E assim alcançar outro nível de interação, abertura e consentimento.
– Quando o tempo acabar tire mais alguns minutos para relaxar e sentir seu corpo e as sensações despertas nele. Recomendo que anote o que sentiu, quais foram as piores e melhores sensações e que tipo de emoções a experiências desencadeou (tesão, prazer, empoderamento, amor-próprio…ou até culpa, ansiedade, frustração ou tristeza). Não se julgue pelo que sentiu, simplesmente aceite o que veio como seu e se permita sentir as diferenças conforme avança nas práticas.
– Você pode achar algumas posições ou toques estranhos e/ou embaraçosos, e está tudo bem. O objetivo aqui é trazer consciência para o seu corpo, para o que você está sentindo, para o presente e para o momento. Sentir as ondas de prazer, o calor, o pulsar, as cócegas, a dormência, as contrações e o relaxamento. Todas essas lindas sensações. Costumamos estar de corpo presente em nossas relações, porém a cabeça está em outro lugar. Ou até fantasiando com situações melhores pois, seja por receio, por medo ou por simplesmente não sabermos, não costumamos falar ou guiar os nossos parceiros para o que nos leva ao êxtase, ou pior, aceitamos comportamentos que nos fazem mal de alguma maneira. Um dos princípios básicos do prazer e da conexão está em relaxar, se deixar levar, se conhecer e ser você mesmo.
– Caso a mente comece a viajar, tente diminuir a velocidade de seus movimentos e traga a atenção novamente ao seu corpo. Quanto mais vagarosos são os estímulos mais facilmente o cérebro consegue focar e sentir cada um deles.
– Com o tempo você vai focado(a) em seu prazer e assim, relaxar, se amar, se empoderar e se permitir sentir novos níveis de prazer, intimidade e conexão com o próximo.
Aprenda a se amar e aprenda a gozar de infinitas maneiras pelo corpo inteiro.
Amar a si mesmx para assim deixar se amadx pelo próximo.
Masturbar-se é uma das experiências mais importante que podemos ter para nos conhecermos. Ele pode influenciar em como percebemos nosso corpo, quais partes tratamos como sexuais ou prazerosas, quais são excitantes e seguras, e quais ignoramos.
Por causa da nossa cultura que culpa e enche tudo que representa nosso prazer de culpa e medo, seja por causa de masculinidades tóxicas, repressões, sexismo e/ou tabus tendemos a resumir nosso toque aos genitais e o ato da masturbação a um meio de simplesmente aliviar a tensão do dia a dia. Isso neurologicamente reduz a excitação e prazer no restante do nosso corpo.
Nos tocar e nos estimular é como comer e beber, estamos fazendo isso a todo o momento, em público ou não. Explorar nosso templo é essencial para definir como nos enxergamos, nos amamos e, consequentemente, como nos relacionamos com o mundo.
Como tal nos masturbamos de maneira leviana e sem amor próprio, que replicamos em nossas relações sexuais, Uma ação mecânica e sem conexão onde o objetivo não é relaxar, aproveitar e tanto receber como dar prazer, mas sim de simplesmente chegar ao orgasmo. E a um orgasmo pequeno, limitado e explosivo, que dura somente poucos segundos e nos drena a energia de tal maneira que, após ele, não temos mais interesse nas trocas de carícias, olhares e energia com nossos parceiros, somente dormir, ou ir embora para ficarmos sozinhos.
Tais relações resultam em um vazio interno e relações falidas. Se não nos amamos como podemos amar ao próximo? Ou deixar que alguém nos ame em sua plenitude? Se não nos entregamos a nós mesmos como podemos nos entregar a alguém e, assim, chegar a novos níveis de prazer? Se não nos conhecemos em nossa totalidade como alguém pode nos conhecer dessa maneira? Alguém pode até nos fazer sentir algo que nunca sentimos, mas caso não soubermos como aquilo aconteceu, dificilmente irá acontecer novamente.